O que ainda precisamos fazer pela segurança do paciente?
Por
José de Lima Valverde Filho,
médico
e coordenador de acreditação do Consórcio Brasileiro de Acreditação (CBA)
Mês
passado o Brasil celebrou o “Abril pela Segurança do Paciente”, data instituída
pelo Ministério da Saúde por ocasião do lançamento do Programa Nacional de
Segurança do Paciente (PNSP). Passados cinco anos, nem todas as instituições de
saúde do país implantaram o Núcleo de Segurança do Paciente, apesar da
obrigatoriedade da RDC 36, de julho de 2013.
Apesar da cultura de segurança estar mais
disseminada entre os profissionais de saúde brasileiros, ainda ocorrem, em
proporções elevadas, eventos adversos evitáveis relacionados a falta de adesão
a procedimentos de segurança. Entre esses eventos, estão os associados a
administração de medicamentos por profissionais da saúde. São eventos com alta
probabilidade de proporcionarem significantes danos aos pacientes, como morte
ou lesões permanentes. Embora a OMS assegure que
é difícil estimar a prevalência desse tipo de evento – denominado genericamente
de erro de medicação –, devido à variação de definições e
sistemas de classificação utilizados, as taxas de prevalência de ocorrência são
amplamente variáveis em diferentes partes do mundo. Um estudo do Reino Unido identificou
que 12% de todos os pacientes de cuidados primários podem ser afetados por um
erro de prescrição ou monitoramento ao longo de um ano, aumentando para 38%
naqueles acima de 75 anos. Em pacientes que receberam cinco ou mais drogas
durante um período de 12 meses, esse risco é de 30%. Outro estudo sueco
encontrou uma taxa de erro de medicação de 42%. Já na Arábia Saudita, um
levantamento concluiu que pouco menos de 1/5 das prescrições de cuidados
primários continha erros, sendo uma minoria, de maior gravidade. No México, um
apontamento revelou que 58% das prescrições continham erros, a maioria de
dosagem (27,6%).
Embora haja alguns
levantamentos pontuais, ainda não se tem um retrato efetivo sobre ‘erros de
medicação’ no Brasil. No entanto, esses exemplos demostram que estamos diante
de um problema global. Além dos erros de prescrição, quando o profissional se equivoca,
de diferentes modos, na prescrição correta do medicamento, as falhas podem
ocorrer na dispensação (quando a farmácia
envia o medicamento errado); por omissão (quando um medicamento prescrito não é
administrado, sem justificativa técnica); por erro de horário (quando os
intervalos de administração são errados ou o medicamento é administrado fora do
horário ou do intervalo terapêutico); de administração não autorizada de
medicamento (quando sem ordem médica, um medicamento é administrado); de dosagem
(quando a dose é inferior ou superior a prescrita);
erro de apresentação (quando o medicamento certo é administrado, mas pela via inadequada ou apropriada); erro de preparo (quando a diluição do medicamento, por exemplo, é feita com diluente inapropriado); erro de administração (quando a via é errada, por exemplo intramuscular ao invés da venosa);
erro com medicamentos já inadequados ao uso (quando medicamentos expirados ou vencidos são administrados); e erro de monitoração (quando são ignoradas as atenções com os possíveis eventos colaterais ou indesejáveis de alguns medicamentos).
erro de apresentação (quando o medicamento certo é administrado, mas pela via inadequada ou apropriada); erro de preparo (quando a diluição do medicamento, por exemplo, é feita com diluente inapropriado); erro de administração (quando a via é errada, por exemplo intramuscular ao invés da venosa);
erro com medicamentos já inadequados ao uso (quando medicamentos expirados ou vencidos são administrados); e erro de monitoração (quando são ignoradas as atenções com os possíveis eventos colaterais ou indesejáveis de alguns medicamentos).
Portanto, as
oportunidades de erros são grandes e somente a qualificação de todos os
envolvidos na cadeia de medicamentos (da aquisição a administração) pode
diminuir a incidência desses casos, que são comumente causados por problemas de
comunicação ineficiente, ambiguidades em nomes de produtos, instruções de
utilização, abreviaturas ou escrita médicas, maus procedimentos ou técnicas, ou
uso indevido do paciente por causa da má compreensão das instruções de uso do
produto.
Para evitar que as possibilidades de erros
aconteçam é preciso estabelecer e rever processos permanentemente. Apontar
culpados só permitirá a reincidência. Em caso de incorreções, a transparência é
essencial para evitar danos maiores. O NHS, sistema nacional de saúde do Reino
Unido, criou o chamado o “Duty of Candour”, que estabelece, entre outros, o
dever do profissional e/ou da instituição em comunicar aos pacientes e
familiares sobre erros. Estudos demonstram que a transparência reduz o litígio.
Entretanto,
nosso maior desafio é lidar com a conscientização do problema. Uma questão
significante é a falta de sensibilidade da indústria farmacêutica que continua
a produzir fármacos diferentes, em embalagens e apresentações muito
semelhantes. É importante também ressaltar que os cuidados com medicamentos
devem ser estendidos a outros produtos, como contrastes e alimentação enteral,
por exemplo. Por fim, mas de
altíssima significância, as estratégias empregadas para a redução de erros de
medicação não podem, em absoluto, prescindir do papel de farmacêuticos clínicos.
Entre outras atividades de responsabilidade na cadeia de aquisição e uso de
medicamentos, são eles que avaliam as prescrições quanto a interações
medicamentosas e a adequação as condições dos pacientes. Outros suportes
reduzem a probabilidade de erros, como a prescrição eletrônica e programas
educacionais, geralmente em intervenções multifacetadas. Há também uma
necessidade de intervenções pontuais como a preceptoria de especialistas para o
uso apropriado de determinados fármacos como os antibióticos.
A Joint Commission International (JCI) e seu
associado brasileiro, o Consórcio Brasileiro de Acreditação (CBA) tem feito
importantes esforços no sentido de disseminar os padrões de Gerenciamento e Uso
de Medicamentos, que é bastante amplo e aborda várias questões sobre fármacos.
Se, efetivamente, implantados reduzem a incidência de erros de medicação. A
Meta Internacional de Segurança do Paciente de número 3 aborda,
especificamente, as condições de identificação, segregação e uso de
medicamentos de alta vigilância e dos eletrólitos concentrados. O CBA tem ainda
abordado o assunto em cursos, palestras, seminários, congressos e nos seus
cursos de MBA e de pós-graduação.
Esse é um
esforço conjunto. Só se muda um comportamento, com diálogo e enfrentamento do
problema. Se queremos um Brasil com mais segurança para o paciente, precisamos
estar imbuídos verdadeiramente de esforços e comprometimentos para que
desenhemos processos cada vez mais seguros.
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